5 de novembro de 2013

Sem título

Morreste num beco qualquer. Sempre quis que fosses a primeira pessoa que conhecesse a pessoa com quem escolhi partilhar a minha vida. Sempre tive uma pequeníssima e inocente esperança que irias aguentar a rotina claustrofóbica desta casa branca e pequena por mim. Porque, no fundo, tu dizias que era o único suporte na tua vida. Transmitiste-me que aguentarias qualquer substância tóxica por nós. Mas, morreste num beco qualquer. E, nesse beco abriram-te um buraco negro com sete facadas e retiram-te aquele quiça que amava. Sempre precisei de ti nos Natais que faltaste. Sempre sonhei ir contigo para o Porto e beber um fino. Está a chegar... E, tenho que engolir, triturar e fingir que não me fazes falta. Tenho que encarar um jantar repartido aos bocados. Fingir estar cega. Ignorar que me falta sempre qualquer merda naquela mesa ainda que tenha comida e um resto de família toda fodida. Morreste num beco qualquer. Não consigo mais marcar encontros contigo. Porque tu és uma coisa... Uma coisa... Que não conheço. Abraças-me e sinto-me pesada. Dás-me um beijo na testa e sinto-me esquisita. Chamas-me princesa e parece que me cospes na cara ao invés de me embalar. E, quando me deito no teu ombro para chorar não é de Saudades. É da morte que vejo em ti e sinto. A pessoa que mais me fez sentir amor platónico morreu dentro dela própria. Acordei! E, a dor latejou. Afinal, tu não és o mesmo. Eu é que guardei a merda da memória de seres igual e não melhor. Quando sais-te por aquela porta... Escrevi em todas as paredes que iria correr bem... No entanto, não existe nada para correr. Porque tu morreste na merda daquele beco. Naquelas tardes de cigarros e cafés, não conseguia encarar o tempo sem ti. O meu velho. Hoje, passam-se tempos infinitos e sinto uma falta de uma pessoa que deixou de existir. O velho dissecou. Sempre foste assim? Ou, foi a nossa ausência que te matou? Se dizes que choras por mim como choras. Se dizes que morres por mim como morres... . Admito que sou uma filha da puta. Nem o meu próprio pai procuro mas olha que merda... Nem sei onde encontra-lo. Acho que desconheces a Vida que tenho levado ainda que percebas a minha, muito minha natureza selvagem. A tua paciência rebentou com a ampulheta de areia. Devias de ter decidido uma mudança. Repara que nem todos os erros são impermeáveis. Alguns furam e bem. Mudado. Virar a tua vida ao contrário... Mas, nunca fui o suficiente. A filha predilecta nunca foi o suficiente. Para ti nada é o suficiente. Nem sangue do teu sangue. Não fiz tanto quanto podia ou talvez até tenha feito. Olho para trás e sinto que não ficou, entre nós, nada por viver. O tempo é assim... Muda tudo. Faz as cenas voar como os kayas que fumo antes de dormir. Tenho que aceitar viver isto sem ti. Isto que não sei o que é. Mas, vivo. Sobrevivo. Apenas vai chegar mais um: Tu morreste num beco qualquer. Não me procuras-te para pedir ajuda. Deixas-te que o teu espírito enfiasse os cornos numa parede e ali ficou. Somente, esse corpo fraco. 


E, fiquei eu. 

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